Quando a vereadora e candidata do PPS à Prefeitura de São Paulo, Soninha Francine, afirmou na sabatina do jornal "O Estado de S. Paulo" que os vereadores paulistanos fazem acertos de todos os tipos e diferentes nuances, mais ou menos republicanas, para a aprovação de projetos na Câmara, foi como se riscasse um fósforo sentada em um barril de pólvora.
A grande maioria dos vereadores simplesmente não admite que algum de seus pares questione as práticas e métodos próprios do parlamento paulistano. Quase como o "código de honra" da máfia, que manda exterminar quem se opõe às regras do crime organizado, alguns vereadores pedem a cabeça de quem ousa questionar o modus operandi das negociatas realizadas na Câmara Municipal.
Não é segredo para ninguém que os projetos de lei - seja de iniciativa do Executivo ou dos vereadores - só entram em pauta após acordo entre os líderes partidários. Como se chega a esses acordos é o grande tabu - que a imprensa não aprofunda e que Soninha vem apontando desde o seu primeiro ano de mandato, sem grande repercussão.
Agora que é candidata à Prefeitura, as mesmas declarações ganham um enfoque diferenciado. Ao passar do seu blog e dos discursos em plenário para a primeira página do Estadão, a indignação de Soninha com essa prática da Câmara caiu como uma bomba sobre os vereadores - que, em vez de pedirem a apuração das acusações, querem a punição da acusadora. Muito singular este senso de justiça e transparência.
Mais estranho é que a imprensa e o Ministério Público trazem evidências diárias dessas práticas - no mínimo questionáveis - dos vereadores. E os próprios parlamentares não escondem, em vários episódios, que trocam o voto em determinado projeto de interesse do governo por cargos na Prefeitura, por exemplo. Isso é dito abertamente. Essa é a própria essência do "Centrão" - grupo de vereadores de vários partidos que se uniram no início da gestão Serra/Kassab e passaram da oposição à situação após serem atendidos pelo governo, inclusive com a nomeação de apadrinhados.
Vereadora do PT vai tirar satisfação de Soninha no banheiro
Uma cena patética: a petista Claudete Alves - famosa pelo slogan mais sui generis da campanha ("O poder tem que menstruar") - viu Soninha sair do plenário em direção ao banheiro e correu atrás da colega para tirar satisfação, dedo em riste e aos berros.
"As vereadoras foram para o banheiro feminino, aonde a discussão tomou corpo. ´Se eu recebi dinheiro, você vai ter que provar´, dizia Claudete. Os gritos entre as duas eram tão altos que podiam ser ouvidos do plenário da Câmara. A discussão só terminou depois que o presidente da Casa, Antônio Carlos Rodrigues (PR), entrou no banheiro acompanhado de uma policial militar e pediu moderação às duas. Policiais militares acompanharam a movimentação de perto. De acordo com Soninha e Claudete, não houve agressão física", relata o jornalista que testemunhou o ocorrido.
Outros vereadores também fizeram ataques à candidata na tribuna, como Gilson Barreto (PSDB). "Não é concebível que um ou outro vereador use artifícios para subir em pesquisas", alegou.
O líder do Democratas na Câmara, vereador Carlos Apolinário, disse que "há pessoas que tem plena capacidade para serem jornalistas, comentaristas de futebol, mas não vereadores".
Ou seja, Soninha pode ser jornalista, porque ao jornalista é permitido questionar o mundo paralelo que funciona na Câmara Municipal - já que na maioria das vezes esse questionamento, feito de fora, é inócuo. O inadmissível para os vereadores é que alguém que tenha adentrado neste ambiente peculiar e conheça seus códigos, ouse desvendar seus segredos. Soninha é a estranha no ninho. Incomoda porque "não sabe fazer acordos" (como já reclamou o presidente da Câmara, Antonio Carlos Rodrigues), ou seja, traduzindo: "não sabe ser vereadora" (como repetiu nesta terça o vereador Carlos Apolinário).
Veja abaixo o vídeo gravado pelo candidato a vice-prefeito do PPS, o cineasta João Batista de Andrade, que flagrou o momento de destempero da vereadora Claudete Alves (PT) e foi impedido de registrar a cena pelos vereadores Antonio Carlos Rodrigues (PR) e Milton Leite (DEM).