A ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL

Primeiramente, como vê o governo do nosso atual prefeito? Quais são os pontos positivos e negativos na prefeitura de Gilberto Kassab?

Acho que tem qualidades. Alguns dos pontos positivos: a corajosa lei Cidade Limpa, uma idéia que muitos urbanistas defenderam por muito tempo mas nunca tinha havido uma ação tão decisiva para diminuir a poluição visual na cidade; a atuação na área ambiental, com o investimentos em Parques Lineares (ao longo de córregos) e ações para desocupação de áreas de manancial, entre outras coisas; na área da Cultura, a recuperação das bibliotecas, o Centro de Juventude da Cachoeirinha e a Virada Cultural. A reestruturação de algumas carreiras do serviço público, como na Educação, e a conclusão da primeira fase do Expresso Tiradentes.

Mas a prefeitura não conseguiu resolver alguns gargalos muito sérios: o congestionamento nos corredores de ônibus e a má qualidade do transporte em alguns lugares, especialmente na Zona Sul; a coleta seletiva, que não avançou quase nada; a demora para se conseguir marcar uma consulta ou exame na rede de Saúde; e a oferta de saídas para a população de rua.

Quais são os principais problemas da cidade de São Paulo? Quais as primeiras medidas a serem tomadas para evitá-los?

Se nós atacarmos ao mesmo tempo duas áreas principais, ajudamos a diminuir a pressão sobre várias outras. Essas áreas são a de mobilidade (trânsito, transporte e locomoção não-motorizada) e do uso e ocupação do território - basicamente, a distribuição de moradia e trabalho pela cidade. Não podemos conviver com tanta desigualdade.

No centro da cidade, temos toda a infra-estrutura urbana instalada, concentração de trabalho e até equipamentos públicos com capacidade ociosa - como escolas com poucos alunos. Na periferia (e nas cidades vizinhas), temos verdadeiros bairros-dormitório, onde as pessoas só tem a moradia e nada mais. Precisamos repovoar o centro da cidade e promover o desenvolvimento sustentável nas periferias.

Com esses dois movimentos, você diminui a pressão por equipamentos na periferia, melhora o trânsito, melhora a saúde... Para fazer esse repovoamento do centro, há vários instrumentos do Plano Diretor Estratégico; é preciso regulamentá-los e colocar logo em prática.

Quais são as suas pretensões ao assumir a Prefeitura da cidade?

Fazer uma gestão que pensa no macro, nas estruturas, nos sistemas, sem jamais esquecer dos "detalhes" - do impacto na vida de cada pessoa. E atacar rapidamente os problemas urgentes, as situações insuportáveis (esgoto a céu aberto, por exemplo) sem esquecer do planejamento para daqui a 10, 20 ou 50 anos. E diminuir todas as distâncias na cidade: entre moradia e trabalho; entre pobres e ricos; entre a população e o poder público.

Como enxerga a situação atual da violência em São Paulo? Qual o principal fator que faz com que o índice de violência nesta cidade aumente?

São vários fatores combinados, mas um dos principais é a urbanização deficiente, que fez com que houvesse enormes bolsões de miséria. Lugares com baixíssimo atendimento das necessidades e direitos fundamentais, onde, na ausências das instituições, para a vigorar a lei do mais forte; onde o crime passa a ser um modelo de sucesso financeiro e de afirmação; onde as perspectivas de realização de sonhos e projetos de vida são muito diferentes de outros lugares da cidade.

Nós precisamos levar urbanização a todos os lugares da cidade e oferecer oportunidades, perspectivas e a chance de um projeto de vida. Precisamos oferecer respeito à vida para ensinar respeito à vida.

Moradores da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, enfrentam grandes problemas no atendimento público hospitalar com o crescimento de doentes infectados pelo mosquito da dengue. Como se encontra a questão da saúde na cidade de São Paulo? O atendimento público de São Paulo suportaria a quantidade de pacientes com dengue encontrados no Rio de Janeiro?

É sempre difícil lidar com uma situação de epidemia, mas não tenho dúvidas de que o sistema de saúde no Rio é pior do que o nosso - mais desorganizado, mais atingido por desonestidades e desvios. A Saúde em São Paulo tem problemas sérios também; como disse, a demora para se conseguir uma consulta com um especialista ou para a realização de um exame diagnóstico é inadmissível. Em alguns lugares, faltam Unidades de Saúde, mas em outros faltam profissionais nas unidades.

Houve avanços na informatização do controle de distribuição de medicamentos e marcação de consultas, mas ainda há muitos "defeitos" no atendimento ao público. E existem áreas nas quais a carência é ainda maior - na Saúde Mental, por exemplo. A rede de atendimento precisa aumentar muito.

Quais são os planos na área da educação? Conforme dados do Saresp 2007, os alunos avaliados das escolas públicas de todo o Brasil sofrem grande dificuldade no aprendizado de matérias como a matemática. O que a prefeitura pode promover para a ampliação do conhecimento, na área de exatas, dos alunos e ter melhor rendimento nas matérias em geral oferecidas nas escolas públicas da cidade?

Precisamos primeiro garantir o básico: que todos os alunos da rede tenham o número correto de aulas, com professores comprometidos com a qualidade no ensino, bem preparados, bem remunerados e com estrutura de apoio adequada - que vai das instalações da escola à segurança no seu entorno. E tem de haver a avaliação dos profissionais segundo o seu desempenho, com gratificações para aqueles que atingirem as metas estabelecidas.

A participação dos pais via Conselho de Escola também é importante e deve ser incentivada. O currículo deve ser enriquecido com atividades extra-classe, como acontece nas boas escolas particulares. E é necessário montar um programa forte de recuperação, com a parceria de entidades se for o caso, para corrigir a defasagem que já existe entre os alunos que estão com um aproveitamento muito menor do que seria o esperado em suas séries.

Existem planos de ampliação do mercado de trabalho para estudantes do ensino médio, superior e aprendiz caso seja eleita prefeita da cidade de São Paulo?

Embora a prefeitura tenha alcance limitado quando se trata de gerar empregos - a conjuntura da economia nacional é muito determinante - há iniciativas que podem ser tomadas pela administração. Nós pensamos em criação de vagas para estágiários e aprendizes na própria administração, e também em mecanismos de incentivo para o setor privado. Por exemplo, a concessão de incentivos fiscais para quem oferecer postos de trabalho para jovens recém-formados, em determinada região da cidade ou em determinada atividade. Ou a exigência de adesão à Lei do Aprendiz por empresas que venham a ter contrato com a administração pública.

Que marca gostaria de deixar de sua gestão, caso seja eleita?

Gostaria de deixar duas marcas. A primeira seria uma melhora na vida de pedestres e ciclistas. Hoje existem 300 mil pessoas, no mínimo, que já utilizam a bicicleta como meio de transporte. São 300 mil pessoas entregues a essa selva - e morre ciclista pra cacete. Pelo preço da Ponte Estaiada, que acabaram de construir, você faz um sistema cicloviário de 200 quilômetros na cidade. A bicicleta não polui, não aumenta o efeito estufa, não congestiona a rua, proporciona atividade física e melhora a relação das pessoas com o entorno.

Qual seria a segunda marca?

O fortalecimento da relação das pessoas com o poder local. Tem que fortalecer as formas de participação popular que já existem - como os conselhos de escola, de segurança, de saúde - e criar outras, com representantes eleitos pela comunidade. É o que se chama de ética da co-responsabilidade. O discurso que se ouve há muitos anos é: cobre o político no qual você votou. Só isso? É preciso mais. É preciso saber o que você vai fazer pela cidade na qual você vive.

Você acredita que pode ganhar ou está se cacifando para o futuro?

Entrei com vontade de ganhar. Mas sei ler os gráficos das pesquisas eleitorais. Por outro lado existe a possibilidade de influenciar o debate eleitoral e até os rumos da próxima administração.

Você vem afirmando que entra com poucas chances na disputa pela prefeitura paulistana. Então, para quê disputar?

Na verdade, ver pouca chance é só uma análise realista. Não é um desejo. É claro que eu vou disputar como se eu pudesse ser a prefeita. E se eu ganhar a eleição? Ótimo! Não é como em algumas eleições que as pessoas entram para marcar posições, apenas para fazer o nome, pensando numa outra disputa daqui a dois anos. Entro para disputar e a disputa tem um grande valor em si. É diferente de você ter obsessão para vitória. É claro que disputo uma eleição querendo ganhar, não tenha dúvida. Mas a obsessão pela vitória leva a uma porção de escolhas erradas já na campanha eleitoral porque você já fica pensando que para viabilizar seu nome você precisa dessa aliança, desse reduto, precisa desse campo. Então, você vai agregando várias coisas a sua campanha só para ganhar e você vai diluindo sua proposta, você vai perdendo identidade. Vai deixando as coisas meio confusas. Essa é que é a diferença. Eu já me vejo com um puta tesão assim nos próximos meses, discutindo programa de governo.

Lá no fundo, alimenta a esperança de uma grande virada?

Surpresas acontecem. Ninguém acreditava na Luiza Erundina quando ela se elegeu prefeita. E lá nos Estados Unidos? Pouca gente conhecia Barak Obama.