A SAÍDA DO PT

O que pesou na escolha do PPS como partido a ingressar depois de uma longa temporada no PT?

Desde a primeira abordagem, eles (dirigentes do partido) fizeram uma proposta muito sedutora pra mim que é a garantia de independência. A frase que eu ouvi era, literalmente, "venha ser independente com a gente". Porque a maior dificuldade, em qualquer lugar em que eu estiver, é de ser obrigada a defender o que eu não acredito, entendeu? Ou de ser obrigada a me opor ao que eu concordo.

Eu vejo que, muitas vezes, num partido, é isso que esperam de você: que você deixe uma parte de suas convicções na chapelaria, na entrada e aí, em nome de um projeto maior para daqui a dois anos, você vota contra uma proposta que, em princípio, você seria favorável, sabe?

Então, me conhecendo muito bem, porque acompanharam esse meu tempo aqui de mandato na Câmara, disseram que o que em outros lugares seria problema, no PPS seria muito bem vindo, porque a idéia é debater, a idéia é ter posições claras, fortes. "É de problemas como você que a gente precisa", garantiram. Achei muito legal.

Que "problema" você era no PT e que o PPS precisa?

O próprio presidente do partido, numa coisa já mais específica, disse o quanto ele acha que algumas posições que defendo são muito caras ao partido, muito importantes, uma discussão mais progressista até de alguns temas polêmicos como drogas e aborto.

Ele disse que ninguém no partido é obrigado a concordar com isso, ou seja, provando aquilo que me prometeram: que as pessoas têm o direito de ter idéias diferentes. Mas que a posição do partido é a favor da descriminalização do aborto, por exemplo. Então, sabendo que eu não fujo de temas controvertidos porque isso pode pegar mal pra mim ou coisa parecida, que é uma qualidade que eles desejavam ter com eles. Muito legal.

A conversa nem começaria, caso não tivesse socialista no nome. Claro que eu só cogitaria entrar num partido que fosse de esquerda, para começar. Aí, finalmente, o que foi decidido foi a proposta de disputar a Prefeitura de São Paulo e poder colocar nossos temas, fazendo nosso debate, com uma outra linguagem, com outro formato, diferente das outras campanhas.

Você guarda alguma mágoa do PT ou do presidente Lula?

Mágoa, não! Jamais usaria a palavra mágoa. Aliás, acho que é um problema sério as pessoas tornarem as coisas pessoais, sentimentais, sabe? Não é que não tenha paixão no que a gente faz. Tive milhões de divergências no PT, alguns quebra-paus mais sérios, às vezes, decepções e incoerências, mas sem mágoas, sem carregar ressentimento. Não vou virar a inimiga número um do PT. Só que vou dar minha batalha num lugar legal.

Por que, enfim, a mudança de partido?

Desde que o PT e o governo Lula começaram a ter problemas mais sérios, acusações de desvios graves de conduta, eu fiz parte de um grupo, dentro do PT, que questionava esses desvios e insistia que, se era verdade que "todo mundo faz" coisas assim (Caixa 2, negociação de votos em troca de "favores"), a gente não podia achar normal fazer também.

Eu também questionava algumas escolhas políticas, que não têm a ver com corrupção mas mostram uma distância muito grande do que a gente sempre defendeu. Política de alianças, por exemplo. Vale tudo para ganhar uma eleição - até aceitar o apoio do Maluf?? Como assim???

Enfim, é até difícil enumerar a quantidade de discussões e brigas que a gente teve - até um ponto em que ficou claro, para mim, que PT não queria mais ser o que era antes... Inflexível com algumas coisas das quais você realmente não deve abrir mão!

O PPS me procurou admitindo que, como todos os partidos, também tem problemas e precisa melhorar. E acreditando que eu sou uma "chata" que cairia bem no partido agora, sendo muito exigente com ele mesmo.

Você é filiada a um partido pequeno, com pequena representação na Câmara. Não terá que fazer muitas concessões para governar?

Não há como ignorar que uma parte do Parlamento só irá apoiar o governo se os seus pedidos forem contemplados - e isso não tem nada a ver com o mérito das propostas. Eu acho possível dialogar, desde que as reivindicações atendam ao interesse público. Se o partido quer indicar alguém para um cargo público em troca do seu apoio, é preciso que o indicado tenha competência. Essa política do “dando que se recebe” está muito arraigada no País, mas tem de ter um limite. O Lula perdeu uma boa oportunidade de escancarar esse esquema quando se elegeu pela primeira vez, com grande apoio popular e simpatia da mídia. Talvez tivesse empacado em algumas realizações, mas teria peitado esse costume ruim. Se você cede, não adianta depois culpar o chantagista.

No jogo político, acha possível vereadores do PSDB apoiarem as propostas de um prefeito do PT, considerando a inimizade entre os dois partidos? Ou vice-versa?

Acho. Aliás, esse foi um dos motivos pelos quais saí do PT. A nossa bancada tinha uma assessoria técnica muito boa, de alto nível, que fazia análises profundas dos projetos em discussão. Mas encerrada a parte técnica, do mérito, vinha a parte da estratégia política, em que se ignorava tudo o que tinha sido dito e alguém concluía: “Vamos votar contra.”

Quem dentro do PT tem as idéias mais diferentes de você?

Setia mais legal falar quem tem idéias mais parecidas... O Zé Eduardo Cardoso, o Paul Singer, o Carlos Neder, o Chico Macena (os dois últimos, vereadores do PT), o Nabil Bonduki (ex-vereador)... Para dar uma resposta mais "em bloco", podemos dizer que o grupo mais próximo da Marta, que esteve na base do governo dela e ficou mais próximo ao grupo conhecido como Centrão aqui na Câmara, é o grupo com o qual eu tenho mais divergências. Até porque foi com esse grupo que eu convivi mais durante o mandato.

Qual é a melhor parte de ser vereadora? E a pior?

A melhor parte é ser capaz de influenciar os rumos da cidade e efetivamente ser capaz de produzir melhoras na vida das pessoas - seja por meio de um projeto de lei, da divulgação de um direito, da fiscalização de um serviço, da promoção de um debate que esclareça as idéias, da influência sobre o Executivo para que tome alguma providência.

A pior é lidar com o desvio de finalidade: com as pessoas que estão na política ou procuram os políticos movidas a egoísmo, ganância ou vaidade; com as decisões políticas que não são tomadas em função dos interesses da sociedade, mas das rivalidades partidárias - como se a política fosse um fim em si, em que o mais importante é derrotar o adversário, custe o que custar.